terça-feira, 15 de setembro de 2009
CRÔNICAS TAILANDESAS – 8
FUNERAIS TAILANDESES
Paulo Emilio de Medeiros
Já que na última crônica falei do mundo interior das pessoas, vou continuar na mesma sintonia, engatar uma marcha e chegar ao tema da morte. Que tem tudo a ver com a vida interior, pois o exterior, esse é desfeito com a morte.
A forma de lidar com a morte diz muito sobre as pessoas. É claro que se você tem como pano de fundo uma perspectiva de inúmeras vidas - fruto da reencarnação - encarará a morte de modo diferente de quem acha que tudo acabou só com uma mortezinha.
Para a grande maioria, budista, dos tailandeses, é indiscutível que a reencarnação existe.
Conseqüência ou não disso, o fato é que os funerais tailandeses são bem diferentes dos nossos. Pra começo de conversa, o velório dura vários dias. Freqüentemente uma semana; mas em casos de morte violenta, apenas três dias. Quando se trata de gente muito importante, o velório pode durar várias semanas, ou até meses, como foi o caso, em 2008, da princesa Galyani, irmã do rei, que morreu em 2 de janeiro e foi cremada em 15 de novembro. Nesses casos, a longa duração permite a todos irem prestar as últimas homenagens ao falecido.
É claro que o defunto é mais ou menos embalsamado. No local do velório, o caixão fica fechado; junto dele, flores e uma foto grande do falecido. Nas cidades menores do interior, membros da família têm que ficar o dia inteiro no velório - e providenciar comida para ser servida a quem aparecer, seja na hora do almoço, na hora do jantar ou ainda mais tarde à noite! Minha mãe, quando contei isso a ela, comentou:
- Filho, esse costume é muito sábio. Depois de ficar uma semana tendo que fazer sala no velório, a família deve é querer ficar livre do defunto o mais rápido possível. A essas alturas, já terão até esquecido da tristeza...
Em Bangkok, cidade grande, a coisa é um pouco simplificada. O caixão fica numa espécie de capela, em um templo budista, e a família só tem que comparecer no final da tarde, todos os dias. Tive a oportunidade, uma vez, de ir ao velório da mãe de uma colega de trabalho, em companhia de outros colegas. Nossa ida foi precedida de consultas e arranjos. No dia escolhido, lá fomos nós para o templo budista. Ao chegar, copiando os colegas tailandeses - embora me fosse dito que não era necessário, por eu ser estrangeiro - sentei-me no chão, depois de tirar os sapatos, e inclinei a cabeça até o solo, com as mãos postas, primeiro em frente a uma imagem do Buda e, em seguida, diante de um retrato da senhora falecida. Fomos então convidados a sentar-nos.
O preto, cor indispensável nos funerais na Tailândia, se fazia presente nos ternos, nas gravatas e nos vestidos das mulheres. O que não impedia que várias destas usassem pérolas. Às 19 horas, quatro monges entraram e, tomando assento em um estrado de madeira, começaram a entoar preces. Olhei ao meu redor e coloquei as mãos postas, como faziam os tailandeses. E não olhei mais para os lados, embora quisesse observar os monges; estando sentado bem na frente, todo mundo veria minha falta de compostura... O canto dos monges, embora a princípio meio dissonante para ocidentais, fluía atraente para os ouvidos. Após uns quinze ou vinte minutos, houve um intervalo, quando foi servida uma caixinha com um salgadinho, um docinho e uma garrafinha de suco de frutas, saboreados em conversas com as pessoas próximas.
A segunda parte das preces foi mais breve. Ao final, fui convidado, junto com outras três pessoas, a fazer uma oferenda aos monges. Sentados no chão em frente a eles, oferecemos, cada um, um corte de tecido para um hábito e uma cesta pequena com outras coisas. “Acabou; podemos ir agora”, me indicou, de modo simpático, o senhor tailandês a meu lado. Mais uma reverência no chão em frente a Buda e outra junto à foto da senhora falecida, uma fotografia de grupo (tirada por um membro da família e depois gentilmente enviada a nós) e saímos. Tudo durou apenas uma hora. Notável a ausência de choros ou conversas tristes.
O mesmo ritual terá ocorrido durante sete dias, sempre às 19 horas. No restante do tempo, o corpo ficou na capela, desacompanhado. E finalmente houve a cremação, no mesmo templo.
Falta contar dos envelopes... Mas isso fica para a próxima. Aguardem!
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Paulo Emílio, suas crônicas são como novela em capítulos.
ResponderExcluirLemos e queremos saber o que vai acontecer depois....rs
Abraço ;)
Vera, desse ponto de vista, elas têm uma vantagem extra: não fazem a gente ficar acordado pra descobrir o que acontece no próximo capítulo (já que não está disponível ainda). Assim, ficamos no caminho do meio: nem zero crônica, nem muitos capítulos.
ResponderExcluirAbraço e até a próxima! (Com direito a muitos envelopes.)
Hahahaha, haja envelopes!
ResponderExcluirAté!
Andei tão ocupada que não estava dando a atenção devida a este blog, especialmente á vc e suas mensagens da Tailândia. Gosto especialmente da forma como vc. coloca as coisas, sempre leves. Fico pensando se já é resultado da sua convivência com esta cultura... Parece que aí não tem urgências, correria...
ResponderExcluirEnvelopes? Como serão?
Méri, talvez seja, sim, resultado de já estar vivendo aqui há alguns anos. Seria um desperdício enorme não aprender nada.
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