sábado, 30 de janeiro de 2010

“AGORA VALE A SUA TORCIDA, AMIGO ESPECTADOR!”

Qual o real significado desta pérola inicial das transmissões esportivas?
Como assim, “Vale a sua torcida”? Vale o que? Audiência para o canal, energia positiva para o time, atleta, equipe, aglomerado? O resultado do jogo é decorrente dessa absurdamente falsa convocação? Vale grana...? Quanto?

“Amigo espectador”. Fica até uma sensação estranha, mas não posso me considerar amigo de um cidadão que não sabe o meu nome, com o qual nunca conversei e, na maioria das vezes, gostaria de ser poupado da forçada contemplação da “simpatética” e sorridente expressão do narrador.
Que intimidades são essas?

Vamos então às divagações analíticas e pentelhas:
Esse discurso pode ser fruto de uma bem estudada postura perante a audiência, a partir de pesquisas que, certamente, comprovam a total solidão do indivíduo - daí o “Amigo espectador” - numa tentativa extremamente calhorda de acorrentar, ainda mais, o indefeso (?) cidadão nos grilhões da escravidão televisiva. Como também a incrível necessidade que geralmente as pessoas têm de se sentirem parte de alguma coisa, influentes nos destinos da humanidade e integrantes de um grupo vencedor - daí o “Agora vale a sua torcida”. Querendo nos fazer crer poderosos e cibernéticos responsáveis pelo resultado final de alguma coisa.

A insistência dos apresentadores, narradores, etc, ao tentar nos fazer cúmplices de suas artimanhas é desagradável, perniciosa e francamente perigosa. Eles nos cercam com todas as armas. Atualmente não basta você se entregar ao, convenhamos, aprazível estado de babância perante o aparelho; é preciso que você também interaja (Ô verbinho pedante!) com a transmissão. Ou seja, além de assistir, você deve estar ligado na internet respondendo a perguntas ou enquetes idiotas. Se for em canal fechado você, além de responder às bobagens, deverá também se manifestar com opiniões cujas, “após rigorosa análise da nossa produção”, serão premiadas com camisas, chuteiras, cotoveleiras ou outros vários componentes do vasto arsenal esportivo de nossos tempos. Claro, as manifestações premiadas serão sempre e sempre as que mais te causarem repugnância, desprezo ou frouxos de riso debochado. Isso no caso de você ter enviado alguma opinião. Caso você não tenha, ainda, obedecido ao chamado superior, as citações das premiadas te darão tempo de ir à geladeira pegar mais uma cerveja. Alegre-se: você ainda tem salvação.

Dentre as formas de escapar dessa covarde arapuca, talvez a mais simples seja zapear. Quando o mesmo evento é apresentado por mais de um canal, zapeie alucinadamente. Assim você vai se esquivando das mesmices hipnotizantes além de poder desfrutar do indescritível prazer de se irritar com diferentes opiniões erradas sobre o mesmo fato.
O único perigo é relaxar a mente. Aí você pode acabar não sabendo bem o que está acontecendo ali naquele emaranhado de pontos coloridos e luminosos.

Outra, mais sutil e recomendada para eventos exclusivos de um canal, é assumir uma postura crítica encarando as óbvias análises dos comentaristas e as frases retumbantes dos narradores sob a fria ótica da sua lógica. Certamente você vai se divertir. Mas a emoção vai pro saco. Daí, a escolha é sua, espectador amigo. Eu faço o seguinte: se o jogo valer a pena, volume a meia bomba e emoção em alta. Se for apenas mais um bom jogo, quer dizer, pode até ser a final do campeonato mas meu time não está nela, volume normal, ar blasé e postura crítica. Normalmente funciona.

Nenhum comentário:

Postar um comentário