De volta à beira mar,
de volta ao ritual de expiação dos meus maus hábitos. Então, vamos à caminhada
na praia. No calçadão, bem entendido, porque não é sempre que a maré fornece
uma areia dura e plana como convém a tão saudável exercício.
As descobertas são
sempre interessantes. Começando pelas tribos várias, temos os empolgados que
correm, dão pulinhos e se esticam sem parar. Depois aparecem os sociais; andam
no mínimo em duplas, falam pra cacete e volta e meia surpreendem como, por
exemplo, dois senhores de aspecto pra lá de respeitável que andavam na minha
frente em ritmo mais lento, conversando e gesticulando com movimentos graves.
Fui ultrapassando também lentamente pra pegar um pedacinho de tão profundo
diálogo que eles pareciam estar travando e escuto: "Ela é muito é da
goshtósa, Ôxe!".
Depois passam os
skatistas. Tenho a impressão que eles treinam exaustivamente em locais secretos
porque torço muito mas nunca vejo nenhum deles tomando um estabaco.
Ciclistas são um caso
à parte. Um grupo é formado pelos que estão ali para se divertir - pedalam,
olham a paisagem, conversam (como esse
povo tem fôlego!) e seguem numa boa.
Outro grupo é composto
pelos atletas que parecem egressos do Tour de France. As bikes (bicicleta é coisa de pobre) são
sofisticadas, os caras se apresentam com roupinhas coloridas de gosto duvidoso coladas
no corpo dos tornozelos até o pescoço, capacetes e óculos invocadíssimos, fones
de ouvido, garrafinhas estrategicamente colocadas no quadro da bike e mochilas
nas costas! Katzo! Pra que mochila? Devem ter lá suas razões que
definitivamente não me interessam.
Outra tribo
impressionante é a das gordinhas velozes. Elas passam correndo ou andando numa
velocidade inacreditável, não bufam e aparentam uma felicidade que não condiz
com seus formatos.
E aí aparecem as
patinadoras. Ah! As patinadoras! São novas, bonitas, corpos perfeitos e
rápidas. Muito rápidas. Mas não o suficiente para esconder que carregam uma
haste com uma GoPro na ponta: elas se filmam patinando! É a selfie elevada à
penúltima potência.
Porque a última
potência será, certamente, quando elas engolirem uma câmera para filmar seus
intestinos malhados e colocar no fêici.
Sigo em frente e troco
de praia. Essa agora é lugar chique e, consequentemente, coalhado de turistas.
Um cidadão trajando um uniforme da segunda guerra mundial caititua passeios no
seu jipe ornamentado como sendo da Royal Air Force. E vende! Às sete horas da
madrugada o cara consegue arrumar clientes! É um gênio do comércio.
Nessa praia os
quiosques estão abertos e a turistada se empapuça de água de côco, açaí e
outras estranhezas naturebas.
Três alegres senhoras,
de sotaque inegavelmente paulista, passam conversando sobre... Compras, é
claro.
É o suficiente. Dou
meia volta e volto ao aconchego da praia mais "normal".
Um bom banho aprofunda
a irritante sensação de bem estar após o dever cumprido, uma coca-cola seguida
de um delicioso cigarrinho justifica a expiação e estou pronto para começar o
dia.
Sento na frente do
computador e ouço gritos abafados debaixo da mesa. São os meus meniscos (ou o que resta deles) reivindicando um
diclofenaco urgente. Informo que serão atendidos depois do almoço e eles
parecem se acalmar.