sábado, 7 de novembro de 2009

MANHUMIRIM OU MANHUAÇU?


“Atores formam um segmento de seres privilegiados: são pagos para fazer o que todos nós fazemos, gratuitamente, durante toda a vida”.
Esta afirmação é generalista, preconceituosa e cínica. Mas, entre outras coisas, serve para criar clima em qualquer reunião social. Serve também pra gente dar uma pensadinha.
A verdade é que todos representamos 24 horas por dia. Claro que os atores estão cumprindo sua missão, sua vocação, estudam muito para fazer o que fazem, etc, etc. Mas nós, reles espectadores, protagonizamos nosso showzinho todos os dias e o que é pior: sem platéia, ou às vezes, com platéia hostil.

Lembra aí, prezado leitor: você ontem saiu de casa cedo, passou na banca, comprou jornal, tomou um cafezinho no bar, chegou no trabalho, falou com os colegas, cumpriu suas obrigações e foi almoçar. Parando por aí, quantos papéis você representou nesse curto espaço de tempo?
Na banca você fez o cidadão amistoso, que conversa sobre os assuntos da hora com aquele distanciamento que sua condição de pessoa bem informada lhe concede.
No cafezinho, fez o apressado executivo que tem coisas importantíssimas a resolver no dia que começa, mas pode se dar ao luxo de perder um tempinho com a plebe para xingar o juiz que roubou seu time no jogo de ontem.
No trabalho, fez o funcionário correto, sempre atento, cumpridor de seus deveres, como também fez um arremedo de Casanova para aquela secretaria gostosa que começou a trabalhar na semana passada.
No almoço, se foi em casa, fez o chefe de família fiscalizador do andamento de seu castelo. Se foi no restaurante, fez o executivo entediado, incrédulo com os rumos da política econômica nacional.
E por aí vai. Se entrarmos pela noite é covardia. Numa mesma noite, começando pelo happy-hour e terminando nas mais obscuras vielas da cidade, os papéis se sucedem numa velocidade vertiginosa.

O que pode nos levar a profundas conjeturas (ou, pelo menos, render assunto):
Desses todos aí, quem sou eu? Sou um deles ou sou a soma de todos? Claro, a segunda opção é a mais comum. Mas não a mais leve. Pensa bem: é chato saber que temos uma atitude, uma postura, uma face para cada situação, para cada ambiente, para cada grupo de pessoas. Que, por sua vez, também são camaleões tanto quanto nós. Daí, só podemos esperar mesmo é esse caos comunicativo em que vivemos, tornando, a cada dia, mais real e menos engraçada aquela velha piada dos dois mineiros que se encontram na rodoviária:
-Pronde cê vai cumpadre?
-Manhumirim.
-Então, boa viagem! (O cumpadre tá falando que vai pra Manhumirim que é preu pensar que ele tá indo pra Manhuaçu. Mas num me engana não.. Eu sei que ele tá indo é pra Manhumirim mesmo!).

2 comentários:

  1. Uai, Tiago, incorporou um existencialista de plantão? Será que o espírito do recém-desencarnado Levi Strauss tá tirando casquinha em você?

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  2. Não tá, não! O recém-desencarnado, definitivamente, não "me fez pensar em muitas coisas"... Eca!

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