Paulo Emilio de Medeiros
Dirigir em Bangkok pode ser uma delícia. (Nunca imaginei que fosse dizer isso.)
Na verdade, aqui talvez seja a cidade onde tive maior prazer dirigindo.
As razões são várias. A principal, para mim, é a necessidade de buscar espaços - senão você não anda; o que faz do dirigir um jogo, como num parque de diversões.
Apesar disso, o trânsito não é selvagem. Há quase total ausência do som de buzinas, e a maioria dos motoristas é paciente e educada. Mesmo no maior engarrafamento, com o trânsito totalmente parado por quinze minutos, não há ninguém buzinando, abrindo o vidro para reclamar ou acelerando o carro com força. Acho que é um toque de sabedoria budista; de aceitação do que é inevitável naquele momento.
Nada é perfeito... Têm o mau hábito de bloquear cruzamentos; se o sinal está aberto, tendem a ir, mesmo que seja só para andar poucos metros e ficarem engarrafados no meio do cruzamento.
Os motociclistas, por sua vez – há em grande número – são alucinados. Ultrapassam ao mesmo tempo pelos dois lados, mesmo em ruas estreitas de duas mãos. Frequentemente ultrapassam pela esquerda quando vão virar à direita logo depois, e pela direita, quando vão virar à esquerda.
Quanto aos ônibus, às vezes param no ponto na pista do meio, longe do passeio, para deixar e receber passageiros, que então têm que cruzar uma pista para chegar à calçada. Quando isso acontece, os carros que vêm atrás param, deixam os passageiros passarem, e as coisas se resolvem. Ninguém xinga ou faz escândalo.
Outra razão para meu prazer ao dirigir é o traçado das ruas. Bangkok tem grandes avenidas, que fazem quarteirões enormes. Um emaranhado de ruas e ruelas permite o acesso ao interior desses quarteirões. Muitas são sem saída, outras não; a maioria é bem estreita, e algumas são estreitíssimas. Quase nenhuma tem passeio.
Esse traçado urbano faz de Bangkok um mistério permanente, que nunca será desvendado.
Se a gente quer escapar dos engarrafamentos nas grandes vias, o jeito é ir por essas ruelas, quando existe essa alternativa. Faço trajetos - sinuosos - desse tipo todo dia, para ir e voltar do trabalho. Aumentam a distância, mas reduzem muito o tempo gasto.
Vou me desviando das ocasionais bicicletas e das pessoas a pé que às vezes vão pela rua empurrando carrinhos de vender comida; ou espero com paciência uma oportunidade para ultrapassá-las. E vou tomando cuidado com as motos, que vão se desviando de mim e me ultrapassando.
Olho o que há para ser visto nesse cenário de ruelas: um bando de tailandeses na porta de uma lojinha; um casal idoso que quase todo dia está sentado na parte de trás de uma camionete, em frente a uma loja, olhando a vida passar; ou uma família inteira numa lambreta, a mãe na garupa, um filho entre ela e o pai, e o outro filho em pé na frente do pai.
Viver na Tailândia, para alguém inserido no mundo ocidental, é uma oportunidade de convivência com ideais budistas de vida; e um aprendizado de tolerância e de diferenças culturais.
Bangkok, 23 de setembro de 2555