Em
2008 minha carteira de motorista venceu e deixei pra lá.
Em
2012 achei que já estava abusando da sorte e fui renovar no Detran de Belo
Horizonte. Levei uma semana entre idas e vindas, filas intermináveis,
taxas diversas, exames em clínica 'conveniada', foto em fotógrafo 'conveniado' e tudo mais que os zelosos
leitores já estão cansados de saber.
Pois
bem, o tempo passa, o tempo voa e mês que vem vence a bendita carteira de novo.
Só que agora estou em João Pessoa...
Saio
cedo e vou a um posto do Detran pertinho de casa.
Sou informado que, como minha
carteira é de outro estado, tenho que ir ao Detran Central para fazer a
transferência e a renovação.
Mole
pra nós. São só 12 km passando por paisagens da melhor qualidade.
Lá
chegando, tudo lotado, difícil de arrumar vaga pra estacionar. Acho uma e
pergunto onde é a renovação de carteira. Bloco C.
Encontro
o bloco, pergunto de novo e sou encaminhado a uma sala cuja recepcionista me
informa que a primeira coisa a fazer é xerocar a antiga.
A
xerox fica ao lado e sou atendido por uma senhora gorda agitada e muito bem humorada.
Ela me explica que também é necessário comprovante de residência.
Mífu,
digo eu.
Ela
nem se abala: -"Vá ali, procure Nanda e diga que Cida pediu que ela lhe faça a
declaração de residência."
Vou
lá, acho a Nanda, falo da Cida, a Nanda olha sobre meus ombros, me viro e lá
está a Cida acenando.
Feita
a declaração, a papelada vai "lá pra dentro pra passar na primeira tela" – seja
lá o que isso signifique.
Passada
a tela, é preciso pagar a taxa. Logo ali no Pag-Fácil.
Chego ao local e dou
de cara com um cartaz: "Pagamentos só em dinheiro".
Mífu
de novo.
Cida
me aconselha a ir a um shopping pertinho.
Pego
o carro e vou ao shopping pertinho à caça de um caixa eletrônico. Ainda faltam cinco minutos para o shopping abrir, tempo para um cigarrinho.
O shopping abre, uma fila de seguranças e recepcionistas aplaudem os felizes consumidores, disfarço a vergonha alheia e pergunto a um deles sobre o paradeiro da bendita máquina. Logo ali.
Saco a quantia, volto ao Detran,
pago a taxa no Pag-Fácil (?!) e entrego a papelada que vai "lá pra dentro pra passar na segunda tela". Nem
me atrevo a perguntar o significado dessas telas e fico só na torcida para que o sistema continue sistemando.
Mais
um tempo, me chamam, me entregam a papelada e me informam que devo ir pegar uma
senha para cadastro.
Encontro
o lugar, pego a senha (P275), e rapidinho sou chamado ao guichê.
O cidadão
confere a papelada e me pergunta se sou doador de órgãos. Respondo que não e comento:
-"Até
que seria uma boa. Como é que faz pra ser doador de órgãos?"
-"Não
tenho a menor ideia. Só estou lhe perguntando porque tenho que perguntar.", responde o cidadão rindo de orelha a orelha.
Tudo
certo, retorno à primeira sala não sem antes tropeçar na Cida.
-"Pagou?
Tá tudo certinho? Corra de volta lá em Nanda!"
Ela
checa a papelada e...
-"Agora
vá ali, pegue a senha da fotografia."
Pego
a senha, sou chamado e, depois de conferir toda a papelada, o cidadão diz preu
me aprumar e me fotografa.
Não
contente, tira todas as minhas impressões digitais que são conferidas
eletronicamente. Depois me estica uma pranchetinha para eu dar meu autógrafo.
-"Agora
vá ali para o exame médico."
Uma
doutora agitada e prestativa me empurra um formulário para ser preenchido. No
estilo daqueles de visto para os EUA, manja?
> Usa drogas ilícitas?
> Consome álcool descontroladamente?
E
por aí vai. Só faltou aquela pérola:
> Planeja algum tipo de atentado
terrorista?
Tira
a minha pressão - sou informado que ela está ótima - e me encaminha ao exame de
vista.
Outra
doutora, esta mais burocrática, me pergunta:
-"Já
foi operado?"
-"Já."
-"De
quê?"
-"Fimose."
Ela
fecha a cara e me põe pra ler aquelas letrinhas que fazem lembrar a piada do
polonês quando o doutor pergunta se ele está vendo as letras e ele responde: "Claro!
Esse cara é meu amigo!"
A
doutora carimba, assina, etc e me manda de volta à Nanda.
Ela
dá uma olhada rápida, destaca um protocolo e diz:
-"Pegue
na 2ª. feira. Mas, pode ser que amanhã à tarde já esteja aqui."
Vou
saindo, passo pela Cida.
Agarro as bochechas dela e sapeco-lhe um beijo na
testa.
-"Ô
amado! Deu tudo certinho? Que bom! Vá com Deus!"
Transcorridas
exatas duas horas e dezessete minutos, vou embora com tudo resolvido. Ao
passar pela descida do Cabo Branco, ainda manhã de sol, o mar arrepiantemente
lindo, continuo rindo dos que não conseguem disfarçar um certo desdém quando
digo que estou morando em João Pessoa.